Era dos Dragões-Guardiões
Antes de qualquer reino erigir suas bandeiras, antes de Crossheaven, Samui ou do Império terem um nome, o mundo era governado por forças que não tinham rosto.
Luz, Nyra (Fim), Vida e Caos não eram deuses, mas Conceitos Vivos – presenças que permeavam tudo: o brilho do amanhecer, o último suspiro antes da morte, o brotar de uma semente, o estalar de uma revolta silenciosa. Quando esses conceitos entraram em tensão, o próprio mundo precisou de um mediador. Essa necessidade se cristalizou em uma consciência: o Tribunal Vivo.
O Tribunal não cria, não governa, não acolhe devotos. Ele apenas observa e julga quando o equilíbrio é rompido de forma irreparável.
Dessa tessitura de conceitos, mana e estrutura nasceu algo novo: os dragões.
Eles não eram filhos dos deuses, nem manifestações diretas dos Conceitos. Eram o resultado natural de um mundo que precisava de guardiões capazes de entender, de forma instintiva, a dança entre mana, matéria e significado.
Nas Ashen Lands, os dragões desciam das cristas de Bloodspire Highlands e dos picos em torno de Tiryndor para viver entre mortais em formas humildes – camponeses, ferreiros, andarilhos, sábios sem nome. Em suas verdadeiras formas, pairavam sobre florestas ancestrais, rios de mana e vales luminosos, ajustando o fluxo de energia como jardineiros ajustam água em um campo.
Foi por intervenção deles que:
florestas não se tornaram selvas de mana incontrolável,
desertos não se tornaram buracos vazios de energia,
tempestades de magia eram desviadas antes de devastar civilizações nascentes.
A cidade de Drakenstone, no coração de Tiryndor, era ao mesmo tempo templo, arsenal e arquivo vivo da memória dracônica. Ali, mortais eram recebidos para aprender agricultura, cura, primeiros rituais de proteção, e, principalmente, limites: até onde o uso da magia era saudável para o mundo.
Durante séculos, essa ordem natural funcionou. Povos humanos, élficos, anões e outros aprenderam a viver em relativa abundância.
Não havia igualdade perfeita, nem ausência de sofrimento, mas o mundo, como um todo, permanecia estável.
Com o tempo, porém, a própria estabilidade começou a gerar uma pergunta incômoda entre mortais:
“Se o mundo já se sustenta, por que ainda precisamos de guardiões?”
Nos conselhos de aldeias, nas cortes de cidades em crescimento, a percepção de tutela começou a soar como limite, não como proteção. Dragões que antes eram vistos como mestres e aliados passaram a ser percebidos, em algumas regiões, como donos do futuro mortal.
Primeiro vieram as comparações (“sem eles, não seríamos capazes?”).
Depois, a suspeita (“o que eles escondem em Drakenstone?”).
Depois, a narrativa (“somos mantidos pequenos para que continuem no topo”).
A Era da Orientação seguiu em frente… mas com uma rachadura crescente na confiança entre guardiões e guardados.
Os dragões, acostumados a ler as marés do mundo, sentiram o incômodo, mas o subestimaram.
Não perceberam que, pela primeira vez, o perigo não vinha de tempestades de mana, nem de criaturas aberrantes – mas da ambição organizada dos próprios mortais.