Samui, o Império, Crossheaven e o Silêncio dos Deuses
Do caos pós-dragões emergiram três grandes focos de poder organizados.
Ao norte, em terras onde o frio preserva tanto corpos quanto histórias, Samui se consolidou como reino de magos, guardiões e veteranos de uma guerra que poucos ainda lembram com clareza: a guerra contra o Rei Demônio.
A ausência de dragões e o desequilíbrio crescente abriram brechas no tecido entre planos. De regiões saturadas de ódio, desespero e mana distorcido, emergiram hordas demoníacas. Samui foi o principal ponto de resistência: fortalezas cravadas em montanhas, vales com círculos protetivos antigos, ordens de guerreiros e magos dispostos a trocar gerações inteiras de sangue por um selo duradouro.
Ao custo de incontáveis vidas, o Rei Demônio foi selado.
O selo nunca foi perfeito – nenhum selo o é.
Mas durou o suficiente para que Samui se moldasse como uma nação obcecada por preparação, vigilância e estudo de magias de longo prazo.
Nas bibliotecas de Samui, regras que dragões antes ensinavam de forma instintiva foram transformadas em teorias, tratados, teses.
Ali se desenvolveu a ideia de que tempo é tão importante quanto poder bruto.
Em outras regiões, a conclusão foi diferente.
Se dragões falharam e deuses nunca intervieram, alguém precisava organizar o mundo por conta própria.
Dessa visão nasceu a expansão dos Imperial Realms – um conjunto de reinos unificados sob um trono disposto a:
padronizar moeda,
criar estradas,
impor leis,
profissionalizar exércitos,
e patrocinar pesquisa arcano-tecnológica – a base do futuro magitech.
O Império vê dragões e deuses como elementos do passado.
Vê Blight, Remnants e sombras como variáveis a serem estudadas e, se possível, controladas ou exploradas.
Para regiões instáveis, a presença imperial parece bênção: estradas, segurança relativa, justiça mais previsível.
Para regiões autônomas, o Império é outra forma de tutela – só que agora com bandeira e impostos.
Em uma zona disputada por fronteiras, comércio e anomalias de mana, ergueu-se algo diferente: Crossheaven.
Originalmente, um bastião militar erguido sobre ruínas onde sombras se moviam com vontade própria, Crossheaven nasceu da constatação de que:
“Se ninguém controlar as sombras, as sombras controlarão o mundo.”
Em vez de negar a escuridão, os fundadores de Crossheaven a estudaram, negociaram com ela, e, em certos casos, fundiram-se a ela.
Disso emergiram:
o Conselho das Sombras,
ordens de guerreiros e magos especializados em manipulação umbral,
técnicas para criar e controlar Revenants – mortos chamados de volta com propósito, não como aberrações.
Crossheaven não é um reino clássico.
É uma cidade-estado, um nó de poder político, militar e mágico construído sobre a premissa de que alguém precisa ser sujo o suficiente para fazer o que ninguém quer admitir que é necessário.
E os deuses, enquanto isso?
Templos foram erguidos em Samui, no Império, nas Ashen Lands.
Nomes foram dados a entidades que encarnavam proteção, justiça, guerra, conhecimento.
Algumas dessas figuras se tornaram deuses de crença – respingos dos Conceitos impulsionados por fé coletiva.
Mas, em essência, os deuses continuaram como sempre foram:
distantes, rarefeitos, mais preocupados com o peso global dos conceitos do que com súplicas individuais.
O silêncio deles alimentou a sensação de abandono.
Para alguns, isso prova que não existem.
Para outros, prova que o mundo foi deixado para ser seu próprio teste.
O Tribunal continuou observando.
Sem ver, ainda, motivo para intervenção explícita.